A Evolução Histórica Constitucional Do Tribunal Do Júri No Brasil

O Tribunal do Júri, tinha sido instituído no Brasil por meio do Decreto Imperial, datado em 18 de junho de 1822, e meses depois, no dia 7 de setembro, um fato marcara a história brasileira, a Independência do Brasil, quando às margens do Rio Ipiranga, D. Pedro I levanta a sua espada e grita: “Independência ou morte!”, e caracterizando o fim do domínio português e a conquista da autonomia política.

Doravante, após o intróito apresentado, vai ser esposado sobre a história do júri popular sob o viés de cada Constituição, e ainda, sobre determinados momentos históricos marcados na história do Brasil:

A PRIMEIRA CONSTITUIÇÃO (autoritária) – 1824 – Império

A Constituição Política do Império do Brasil, de 25 de março de 1824, e nos termos do seu art. 4º, a dinastia imperante tinha sido do Imperador Dom Pedro I. E neste primeiro contrato constitucional, o Júri, inserido na porção reservada ao Poder Judiciário, teve sua competência distendida para uma série de condutas ditas típicas além de litígios cíveis, nesse sentido, explicita o Título 6º (Do Poder Judicial), Capítulo Único (Dos juizes e Tribunaes de Justiça)(sic), artigo 151, ipsis litteris:

Art. 151. O Poder Judicial independente, e será composto de Juizes, e Jurados, os quaes terão logar assim no Civel, como no Crime nos casos, e pelo modo, que os Codigos determinarem. (sic)

Destarte, compelia, assim, aos magistrados, tradicionalmente, a aplicação da lei vigente, segundo o pronunciamento do Tribunal Leigo, consoante o artigo seguinte, in verbis: “Art. 152. Os Jurados pronunciam sobre o facto, e os Juizes applicam a Lei.”(sic)

No artigo 179, sob o Título 8º (Das Disposições Geraes, e Garantias dos Direitos Civis, e Políticos dos Cidadãos Brazileiros) (sic), se estabeleciam inúmeras garantias e direitos individuais. Entretanto, justamente nesse período de ascensão desses direitos fundamentais em todo o mundo, o Brasil não considerou o Júri Popular.

A SEGUNDA CONSTITUIÇÃO (democrática) – 1891 – 1ª Constituição republicana

A Primeira Carta Republicana dos Estados Unidos do Brasil, de 24 de fevereiro de 1891, sob o governo de Marechal Deodoro da Fonseca, que teve o seu primeiro governo de 15 de novembro de 1889 a 25 de fevereiro de 1891, e o segundo, do dia 25 de fevereiro de 1891 a 23 de novembro de 1891, trazia em seu Título IV (Dos Cidadãos Brasileiros), Seção II (Declaração de Direitos), no artigo 72, parágrafo 31, o seguinte texto: “É mantida a instituição do júri”.

Ademais, subtraindo-se da esfera constitucional do Poder de Julgar, para destacá-lo entre direitos e garantias individuais e coletivos, do que resultou vigoroso embate jurídico decorrente da perfunctoriedade referencial manteve-se a instituição do Júri. Por oportuno, importa destacar, ainda, que tal resultado foi obtido graças à intransigente defesa da instituição feita pelo eminente Rui Barbosa.

A TERCEIRA CONSTITUIÇÃO (democrática) – 1934 – era Vargas

No Diploma do século XX, datado em 16 de julho de 1934, durante o primeiro governo de Getúlio Vargas que perdurou entre os dias 03 de novembro de 1930 a 20 de julho de 1934, no qual ficou marcado a primeira agressão contra a instituição do Tribunal do Júri, o referido diploma político voltou a inserir o júri no capítulo que tratava do Poder Judiciário, isto é, o que havia sido expresso no primitivo diploma de 1822.

Assim, foi transferindo a conquista cidadã “Dos direitos e garantias individuais”, para o Capítulo IV (Do Poder Judiciário), Seção I (Disposições Preliminares), em seu artigo 72, que expõe: “É mantida a instituição do júri, com a organização e as atribuições que lhe der a lei.”

A QUARTA CONSTITUIÇÃO (autoritária) – 1937 – Estado Novo

Durante o segundo governo de Getúlio Vargas, a saber, datada em 20 de julho de 1934, ele aplicara um golpe de estado no dia 10 de novembro de 1937, instituindo, assim, o Estado Novo. Em seguida, a dissolução do Congresso, e a outorgada da Constituição de 1937, que o garantiu no poder do dia do golpe até 29 de outubro de 1945, pondo fim à luta sucessória dos candidatos à Presidência da República, o que fez surgir mais tarde, a lei da ditadura militar, que como é sabido foi período em que o Tribunal do Júri sofreu o seu pior golpe.

Durante esse período, muitos juristas da época tiveram como primeira reação, de que o júri teria sido extinto, porém esse entendimento não se sustentou, visto que o Decreto-Lei nº 167, de 05 de janeiro de 1938, regulou a instituição do júri, evidenciando a sua presença no sistema jurídico.

A soberania do tribunal popular deixou, legalmente, de existir a partir da promulgação arbitrária do referido Decreto-Lei. Isto é observado no resumido e contundentemente texto inferido por James Tubenchlak, in litteris:

[…] O artigo 92, b, do citado decreto-lei, não fez menos do que abolir a soberania dos veredictos, ao ensejar recurso de apelação quanto ao mérito, nos casos de ‘injustiça de decisão, por sua completa divergência com as provas existentes dos autos ou produzidas em plenário’. E, consoante o artigo 96 do mesmo diploma, o Tribunal de Apelação poderia, ao prover o recurso, aplicar a pena justa ao absolver o réu, conforme o caso, se a decisão do Júri não encontrasse nenhum respaldo nos autos.

Como se pode observar tratou-se de uma norma nitidamente produzida sob a égide de um Estado totalitário.

A QUINTA CONSTITUIÇÃO (democrática) – 1946 – Restauração democrática

No dia 18 de setembro de 1946, durante o governo do Presidente da República Gaspar Dutra, que exerceu seu mandato de 31 de janeiro de 1946 a 31 de janeiro de 1951, tinha sido restaurado constitucionalmente a democracia dos Estados Unidos do Brasil, e assim, trousse de volta o Tribunal do Júri, consoante o seu Título IV (Da declaração de direito), no Capítulo II (Dos direitos e das garantias individuais) artigo 141, parágrafo 28, trazia a seguinte redação, in verbis:

Art. 141, parágrafo 28 – É mantida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, contanto que seja sempre ímpar o número dos seus membros e garantido o sigilo das votações, a plenitude da defesa do réu e a soberania dos veredictos. Será obrigatoriamente da sua competência o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

Um grande ato político que marcou a história fora no ano anterior a esta Constituição, com a redemocratização do país em 1945. A Constituição de 1946 tinha sido oriunda de uma Assembléia Nacional Constituinte convocada após o afastamento de Getúlio Vargas do poder, da qual participaram representantes de todas as correntes políticas existentes no país.

Na verdade, foi especificamente a Emenda n.º 2.726, de autoria do constituinte paulista Aloísio Carvalho, que trouxe de volta a instituição do júri ao bojo constitucional, inclusive, a subcomissão que avaliou essa proposta deu parecer favorável. 

Ocorre que, a Comissão Constitucional não aceitou a emenda, o que fez surgir em defesa da instituição do júri, Ataliba Nogueira apud Sahid Maluf, in verbis: 

O Tribunal do Júri, das instituições humanas de todos os tempos, é a que mais tem resistido aos contratempos e contra-ataques, aquele que mais se entranhou no espírito democrático dos povos; é uma instituição necessária à democracia, como complemento do regime democrático. Mesmo na concepção moderna de democracia, não podemos afastar o cidadão da função de julgar, uma vez que colabora no governo elegendo seus dirigentes, colabora na confecção da lei elegendo parlamentares, colabora na distribuição da justiça, julgando seus semelhantes.

A SEXTA CONSTITUIÇÃO (autoritária) – 1967 – Ditadura Militar

Durante o governo do Marechal Castelo Branco que se iniciou em 15 de abril de 1964 a 15 de março de 1967, tinha sido determinada uma nova Constituição, produzida sob o regime militar no dia 24 de janeiro de 1967.

Em seguida, tinha sido eleito indiretamente o Presidente da República Marechal Arthur da Costa e Silva, que iniciou o seu governo em 15 de março de 1967.  Mas, o pior ainda estava por vir no ao seguinte, porque em 1968, no dia 13 de dezembro tinha sido decretado pelo governo, o Ato Institucional n.º 5 (AI-5), sendo este o mais duro ato do governo militar.

Em que pese toda essa turbulência política, nesta mesma Constituição de 1967, ainda foi possível ser mantida a instituição do júri, no Título II (Da Declaração de Direitos), Capítulo IV (Dos Direitos e Garantias Individuais), no artigo 150, parágrafo 18, in litteris:

Art. 150 – A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[…]

§ 18 – São mantidas a instituição e a soberania do júri, que terá competência no julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

[…].

Diante dessa redação ficou evidente a intenção do legislador, que demonstrou que a competência do júri seria constitucionalmente limitada, de maneira que foi mantida para julgar crimes dolosos contra a vida e nenhum outro além desses.

A SÉTIMA CONSTITUIÇÃO (autoritária) – EC nº 1 – 1969 – A.I. nº 12

Há uma discussão entre os doutrinadores, se a Emenda nº 1 foi ou não uma nova Constituição, porque para alguns, ela foi uma emenda que alterou a carta de 1967, e para outros, foi uma nova Carta Magna, visto que ela alterou quase toda a estrutura daquela carta.

Nesse período histórico os Ministros da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, no dia 31 de agosto de 1969, comunicaram à nação o impedimento temporário do Presidente da República Marechal Costa e Silva, para o pleno exercício de suas funções, por isso, o Décimo Nono Período de Governo, compreendido entre 15 de março de 1967 a 15 de março de 1971, foi considerado encerrado a 31 de agosto de 1969. 

O Ato Institucional n.º 16/69, declarou vago os cargos de Presidente e Vice-Presidente, marcando novas datas para eleição e posse dos futuros titulares.

Surge o governo provisório, que tinha sido comandado pela junta militar que assumiram a chefia do Governo após a edição do Ato Institucional nº 12/69. 

O governo passou a ser formado pelo Brigadeiro Márcio de Souza Mello, Ministro da Aeronáutica; pelo Almirante Augusto Hamann Rademaker, Ministro da Marinha; e pelo General Aurélio Lyra Tavares, Ministro do Exército. Ambos governaram entre os dias 31 de agosto de 1969 a 30 de outubro de 1969.

Seguindo o entendimento de Adriano Marrey, Alberto Silva Franco e Rui Stoco, a Magna Carta de 1967, comparando-se com a redação da E. C. nº 1/69, haviam preservado a instituição do júri com competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, porém, com a redação desta um pouco diferente daquela, conforme o artigo 153, parágrafo 18, no Título II (Da Declaração de Direitos), Capítulo IV (Dos Direitos e Garantias Individuais) da E.C. nº 1/1969:

Art. 153 – A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos têrmos seguintes:

[…]

§ 18. É mantida a instituição do júri, que terá competência no julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

[…]. (sic)

A OITAVA CONSTITUIÇÃO (democrática) – 1988 – Constituição Cidadã

Durante a sua promulgação pela Assembleia Nacional Constituinte, liderada por Ulisses Guimarães, durante o governo do Presidente da República em exercício, a saber, José Sarney, tinha sido reclamado o Estado democrático de direito, com a vigente Constituição Cidadã, que no protrair dos anos, encontra-se no momento, com 65 emendas constitucionais.

O referido governo teve início no dia 21 de abril de 1985, o ano em que se extirparia de uma vez por todas a ditadura militar, e se encerrou no dia 15 de março de 1990. 

Este mandato foi por sucessão, em virtude do falecimento do Presidente Tancredo de Almeida Neves, empossado em 15 de março de 1985. Ressalta-se, ainda, que José Sarney exerceu o primeiro governo civil após o movimento Militar de 1964.

Aqui o Tribunal do júri foi inserido no Título II (Dos direitos e garantias fundamentais), Capítulo I (Dos direitos e deveres individuais e coletivos), adquirindo em sua plenitude o condão de direito fundamental do homem, o que lhe concede o direito de ser julgado por membros de sua própria comunidade.

No sobredito título e capítulo, encontra-se inserido o art. 5º inciso XXXVIII, alínea “d”, que prevê a competência exclusiva do Tribunal do Júri para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, consumados ou tentados, sendo eles: homicídio (artigo 121, caput, parágrafos 1º e 2º, do CP), induzimento, instigação ou auxílio a suicídio ou a automutilação com resultado morte (artigo 122, caput, parágrafo 2º, do CP), infanticídio (artigo 123, do CP), aborto provocado pela gestante (artigo 124, do CP),  ao 127, do CP), aborto provocado por terceiro (artigos 125 e 126, do CP), e aborto qualificado (artigo 127, do CP).

Autor: MARQUES, Márcio Rangel

Obs.: Parte da monografia defendida na Faculdade Direito em 2011.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição Politica do Imperio do Brazil de 25 de março de 1824. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao24.htm. Acesso: 22 mai. 2011.

BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 24 de fevereiro de 1891. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao91.htm. Acesso: 22 mai. 2011.

BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 16 de julho de 1934. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao34.htm. Acesso: 22 mai. 2011.

BRASIL. Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 18 de setembro de 1946. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao46.htm. Acesso: 04 jun. 2011.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1967. Disponível em: http://www .planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao67.htm. Acesso: 24 de jun. 2011.

MALUF, Sahid. Direito Constitucional. 3. ed., rev. e atual. São Paulo: Sugestões Literárias. 1967. p. 425.

MARREY, Adriano; et al. Teoria e prática do júri. 6. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1997. p. 59. [1] BRASIL. Emenda Constitucional nº 1 de 17 de outubro de 1969. Disponível em: http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc_anterior1988/emc01-69.htm. Acesso: 24 de jun. 2011.

TUBENCHLAK, James. Tribunal do Júri. Contradições e soluções. 5. ed. São Paulo: Saraiva. 1997. Apud Ricardo Vital de Almeida. Op.Cit. p. 39.

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